A feroz Família Bocchicchio

Arnaldo Gunzi
2 min readApr 30, 2024

Estive a ler “O Poderoso Chefão”, a versão livro, de Mário Puzo. Uma vez que sou completamente fascinado pelo filme, foi uma leitura deliciosa, preenchendo detalhes que não estão bem explicados no filme.

Em geral, o livro é bem fiel ao filme. Aliás, os filmes, porque o livro cobre o primeiro filme e metade do segundo (a parte do jovem Vito Corleone em NY antes de se tornar Don Corleone).

O livro quase sempre tem muito mais informação do que cabe num filme de duas horas e pouco. A história mais interessante não descrita no filme é em relação à família Bocchicchio.

Eles não eram uma das grandes e poderosas famílias da máfia de NY, muito pelo contrário: tinham nenhum poder. Eram toscos, primitivos, muito unidos em torno da família e com tradição siciliana feroz.

Por essas características, eram utilizados como garantia, na intermediação de conversas entre famílias.

Trecho do livro: “Quando as Famílias em guerra desejavam fazer paz e queriam parlamentar, entravam em contato com o clã dos Bocchicchio. O chefe do clã promovia as negociações iniciais e fornecia os reféns necessários. Por exemplo, quando Michael foi encontrar-se com Sollozzo, um Bocchicchio fora deixado com a Família Corleone como garantia pela segurança de Michael, tendo o serviço sido pago por Sollozzo. Se Michael fosse assassinado por Sollozzo, então o refém Bocchicchio mantido pela Família Corleone seria morto pelos Corleone. Nesse caso, os Bocchicchio se vingariam de Sollozzo como a causa da morte do membro de seu clã.”

É uma lógica bem estranha. O contrato não é um pedaço de papel em cartório, o contrato é a palavra, e o pagamento é o sangue. Se Sollozzo traísse o acordo, Corleone assassinaria o refém Bocchicchio, e o resto dos Bocchicchio iria com tudo para cima de Sollozzo, por ter quebrado o acordo. Como eram ferozes e primitivos, dava para garantir que não desistiriam facilmente, no mínimo ocorreria uma boa briga.

Don Corleone utilizou os Bocchicchio em outra ocasião, quando chamou os chefes das outras famílias para uma reunião geral, a fim de selar um acordo de paz. Como demonstração de boa-fé, contratou o serviço de “refém profissional” dos Bocchicchio para ajudar a convencer os demais de que não haveria emboscada ou algum outro truque sujo.

Por fim, uma última participação dos Bocchicchio foi na volta de Michael Corleone da Sicília. Um membro da família meteu-se em encrenca, assassinou alguns ex-sócios, e fez um acordo com Don Corleone. Em troca de sustento da família, ele assumiria a culpa pelo assassinato de Sollozzo e do capitão da polícia, assim livrando Michael da mira da justiça.

Seja como for, é uma “profissão” bem estranha.

Originally published at https://ideiasesquecidas.com on April 30, 2024.

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Arnaldo Gunzi

Project Manager - Advanced Analytics, AI and Quantum Computing. Sensei of Analytics.