A Alquimia de Rory Sutherland (parte 3 de 3)

Arnaldo Gunzi
5 min readMar 11, 2024

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Sobre marcas. Um produto é mais confiável quando tem uma marca reconhecido. Isso porque ela tem mais a perder, tem uma reputação a defender. Imagine uma TV de uma marca aleatória. A TV pode quebrar, você perder boa parte do investimento, e não tem nenhuma perda ao fabricante, já que a marca não vale nada mesmo. Já um grande fabricante terá muito a perder — não à toa, eles até oferecem garantia pós-venda.

A reputação é uma espécie de “skin in the game”, ter a pele no jogo. Algo a perder se o produto não tiver qualidade suficiente.

O poder do Rebranding. O autor cita um nome de peixe que mudou na Inglaterra. Um exemplo claro para mim é o “gelato”, que é um sorvete premium (e é cobrado como tal).

Outro fenômeno. Tudo que é prato de comida e tem nome italiano ou francês parece mais legítimo e dá para cobrar mais caro.

Criar nome para comportamento cria realidade. Exemplo é o “motorista da rodada”, aquele que não bebe e fica responsável por dirigir pelos demais. A criação do motorista da rodada foi deliberada. O objetivo era tornar aceitável o convívio nos bares para quem não quer beber. Conta Sutherland que chegaram a incluir o termo em séries da TV, a fim de popularizar. E isso deu muito certo.

Outro caso citado é o do lionfish. Uma espécie de peixe, invasora, que surgiu na Inglaterra. O pessoal da Ogilvy criou uma campanha, criando pratos culinários, incluindo receitas nos programas de TV deste tipo. Tudo isso para criar um predador para a espécie, o pior predador, o ser humano.

Case de Akio Morita, fundador da Sony. Os primeiros “rádios de bolso” criados não eram tão pequenos assim, não cabiam no bolso. Para resolver isso, a Sony fez uniformes com bolsos maiores para os seus funcionários. Se você não consegue fazer o rádio menor, faça bolsos maiores.

Outro caso de Morita. Os engenheiros da Sony descobriram uma forma de gravar as fitas cassete, além de reproduzir. Porém, Morita vetou a funcionalidade de gravação, à época. Isso tudo para focar, para não confundir o consumidor com tantas opções.

Existe um nome para essas funcionalidades possíveis. Em inglês, é o “affordance”. Algo como “disponibilidade”. E, como o pessoal da Sony fez, às vezes é melhor focar do que sobrecarregar. Décadas depois, Steve Jobs faria o mesmo no design do iPhone. Um único botão e um design simples, em contraste aos infinitos botões do Blackberry.

Qual o gosto da água? A água tem gosto de nada. Há uma teoria sobre a ter gosto de nada: isso serve para facilitar identificação de algo diferente. Digamos, se a água tivesse sabor de limonada, seria mais difícil identificar algum poluente, um gosto de carne podre, por exemplo. A evolução da natureza calibrou o gosto de água como neutro, segundo essa ideia.

Anéis de diamantes são uma sinalização. Não têm valor útil para nada, servem apenas como um sinal, uma prova cara de comprometimento. Se o homem gastou um ano de salário para comprar o anel, vai ser caro se comprometer com outra pessoa.

Atos que são custosos a curto prazo, só se pagam no longo prazo, e comportamento coletivo estão intimamente ligados.

A Teoria dos Jogos comprova que a cooperação é maior quando há expectativa de repetições frequentes. Quando o encontro é único, há maior chance de não cooperação. Este é outro ponto a favor das marcas, que esperam muitas interações a longo prazo.

Sobre importância das marcas. Na antiga União Soviética, o pão era pão, sem marcas distinguindo a padaria de origem. Ninguém tinha incentivo para criar algo bom, por não ter marca — muito pelo contrário, fazer algo ruim era mais fácil, e não tinha como identificar quem produzira. Não havia loop de feedback.

O mesmo ocorria com marcas para peças de maquinário. Não havia marcas por ideologia de que tudo deveria ser igual. Porém, qual a forma mais simples de cumprir sua cota e produzir mil peças para carros? É produzir mil peças ruins, inúteis, já que não teria como distinguir. A União Soviética engoliu o orgulho e as peças voltaram a ter a marca do fabricante.]

Outro caso sobre o tema. O chocolate também não tinha marcas, era só chocolate. Porém, tinha um número de série, e o relato de uma pessoa da época era o de procurar apenas chocolate com número começando com “C”, já que era a única forma de identificar o fabricante…

Sobre placebos.

Antes dos antibióticos, medicina era quase placebo. O placebo tem um poder enorme no comportamento humano.

O autor cita um caso de família de remédios voltados para tipo diferente de dores — diferentes caixas, diferentes cores para cada dor. O problema é que esse grupo todo de remédios era exatamente igual em termos de princípio ativo — só mudava a caixa. Do ponto de vista químico é trapaça. Do ponto de vista psicológico, é provável que funcione bem. O placebo funciona melhor se voltado a uma promessa específica.

Por que placebo funciona? Uma teoria é a de convencer o corpo a investir mais na própria recuperação. Experimento com ratos mostra que um dia claro proporciona melhor recuperação, talvez pelo inconsciente ter mais esperança de recuperação, e por isso funcione melhor. Talvez o placebo diga: corpo, vou te ajudar, então faça sua parte.

O Red Bull é uma forma de placebo. É caro, pequeno, gosto esquisito. Todas as características. A pessoa tem que fazer sacrifício, pagando mais, suportando o gosto, entrando no ritual — os melhores placebos são assim.

O livro de Rory Sutherland é uma tremenda aula de marketing e de psicologia humana. É um achado, um livro bastante prático, com ótimos exemplos de ideias absurdas que funcionam.

Originally published at https://ideiasesquecidas.com on March 11, 2024.

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Written by Arnaldo Gunzi

Project Manager - Advanced Analytics, AI and Quantum Computing. Sensei of Analytics.

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